domingo, 23 de novembro de 2008

A jornada rumo à cura interior


Isabelle Ludovico*

Existe em nós um vazio tão grande que somente o Deus infinito pode preencher. Somente a experiência do amor incondicional de Deus pode curar nossas feridas de rejeição. Para isso, é preciso enxergar Deus como um pai acolhedor que nos criou e resgatou para construir conosco um relacionamento tão íntimo quanto o que o une ao seu próprio Filho. Esta verdade, quando assimilada no mais profundo do nosso ser, supre o desejo vital de sermos amados de forma plena e irrestrita. A qualidade de amor pela qual ansiamos é humanamente impossível, pois nossa capacidade de amar é limitada.

Assim, desde o ventre, esta expectativa é frustrada e gera feridas que vão se acumulando e nos deformando. O primeiro passo para a cura é reconhecer o mal que nos fizeram. Pois nossa tendência é negar este mal para tentar nos proteger do sofrimento ou assumir a culpa por ele de forma a proteger os outros. Em vez de reconhecer as limitações dos nossos pais, preferimos arcar com o ônus deste amor incompleto. Por não recebermos o amor que almejamos, passamos a nos sentir indignos dele. Como comenta Lya Luft no seu livro O Rio do Meio ao lembrar a experiência de ter sido internada num colégio: “Se me castigaram tanto, e são pessoas boas, e me amam como dizem, com certeza devo ser muito má”.

A jornada rumo à cura passa pela própria dor. Enquanto negamos essas feridas, a criança dentro de nós não pode crescer, pois permanece aprisionada, à espera de alimento e consolo. Sem tomar consciência desta realidade, reagimos diante das situações da vida a partir da nossa sofrida e negligenciada criança interior. Buscamos confirmar as hipóteses que minam nossa auto-estima ou esperamos que alguém preencha os buracos, aos quais somente nós temos acesso.

O segundo passo é reconhecer o mal que fizemos a nós mesmos com o mal que nos fizeram. Quando negamos a nossa dor, rejeitamos esta criança interior que irá tentar chamar nossa atenção através do mecanismo de somatização. A dor emocional que ignoramos irá se transformar em dor física, pois estaremos adoecendo. Em vez de novamente amordaçar esta dor com remédios para conseguir um alívio imediato, precisamos dar ouvidos a ela para tentar decifrar o que está querendo nos ensinar. O sintoma é um sinal de alerta que, se for suprimido, pode provocar um mal ainda maior até ser finalmente levado em consideração.

Quando assumimos a falha do outro, vamos desenvolver uma auto-imagem deturpada ou nos punir, em que nos tornamos nossos próprios carrascos. O atalho oposto consiste em alimentar uma autocomiseração que nos transforma em vítima inocente e passiva. Na maturidade, percebe-se que não importa tanto o que fizeram conosco, mas o que fizemos com o que realmente nos aconteceu.

Identificar os mecanismos de defesa que nos aprisionam é uma tarefa árdua. Com o intuito de nos proteger do sofrimento, acabamos provocando um mal maior, pois vamos limitando nosso espaço interior e exterior. Adoecemos, fugimos através do ativismo que nos leva ao estresse, desenvolvemos armadilhas contra nós mesmos provenientes dos sentimentos de autodepreciação, autopunição e auto-sabotagem. Em vez de repetir este mal, alimentá-lo e multiplicá-lo, a Bíblia nos convida a “vencer o mal com o bem” (Rm 12.21). O amor de Deus é o único antídoto para o veneno do desamor. Este amor é manifesto e acessível aos homens em Cristo, que se identificou conosco e levou sobre si todas as nossas feridas.

Às vezes precisamos que alguém nos acompanhe neste caminho em direção à Verdade, pois tememos ser destruídos por descobertas avassaladoras ou emoções incontroláveis. Um terapeuta pode ser um guia seguro nesta empreitada. Encarar o nosso mundo interior, as nossas dores, mágoas, decepções, é a única forma de nos reconciliarmos conosco mesmos e com a nossa história. Resgatar esta criança abandonada, dar-lhe colo, sendo pai e mãe de nós próprios, nos liberta da dependência dos outros e nos capacita a construir relações maduras e equilibradas.


* Isabelle Ludovico é cristã, psicóloga e terapeuta familiar.

Um comentário:

Anônimo disse...

Consegui copiar e repassar a mensagem de cima. Como não consegui fazer o mesmo com essa, que é ma-ra-vi-lho-sa, repassei o e-mail que vc me mandou com o endereço. Assim todos podem ver, analisar e postar.

AMO QUANDO VC POSTA!!!

Bjuxxxxxxxxxx